sábado, 15 de fevereiro de 2014

TDAH e as fases da vida: adolescência, adulto e velhice

Uma das poucas certezas que temos em nossas vidas é que vamos nos desenvolver, crescer. Começamos pela infância, passamos pela adolescência, nos consolidamos na fase adulta e nos readaptamos na velhice. As fases da vida nos perpassam e com elas, as mudanças físicas, mentais e sociais são inevitáveis. É importante observar que esse desenvolver ao longo da vida se dá de maneira diferente para algumas pessoas, de acordo com suas limitações.1

Partindo da ótica do TDAH, o objetivo dessa postagem é de tentar entender como se dão essas fases da vida, quais as dificuldades e quais os métodos usados para lidar com os percalços consequentes desse transtorno. A princípio, antes de começarmos a destrinchar o nosso objetivo, temos que refletir e nos posicionar na seguinte dicotomia: o TDAH é um transtorno temporário ou permanente?

Vale ressaltar que para uma pessoa ser diagnosticada com o transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), tem que apresentar um conjunto de sintomas neurológicos e comportamentais e condições ambientais desfavoráveis ao desenvolvimento, ao qual o sujeito está exposto. Um transtorno, como o TDAH, afeta as funções executivas do sujeito (auto-controle e auto-regulação),  e não tem cura, mas que pode ser controlado e atenuado ao longo do tempo. Com isso, podemos dizer que o TDAH é um transtorno permanente, que quando diagnosticado e tratado de forma consciente, pode favorecer ao portador um desenvolvimento sem grandes danos. De acordo com o Manual Clínico do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade,

No que se refere aos critérios diagnósticos usados nas pesquisas, o que se pode verificar é que os critérios do DSM-IV tornam-se gradativamente menos sensíveis ao transtorno á medida que a idade aumenta. Esses critérios mostram-se adequados para o reconhecimento de casos na infância e inicio da adolescência. Tornam-se um pouco menos adequados na adolescência mais tardia e menos acurados ainda à medida que a pessoa ingressa na idade adulta. (Manual Clinico do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Org.: Ana G. Hounie e Walter Camargos Jr. Editora Info Ltda, 2005. , p. 511)


TDAH na fase da adolescência

A adolescência é uma fase de intensas e significativas mudanças, é o momento em que o/a sujeito(a) se vê fora da infância, começando a construir seus objetivos, tomando posse das suas responsabilidades e desejos, até adentrar a fase adulta. O adolescente em si é um ser em conflito, é normal nessa etapa da vida os jovens terem que tomar decisões importantes, que por muitas vezes o acompanharão pela vida adulta. 

A relação que um jovem com TDAH tem com a família, a escola, as suas emoções e as suas descobertas é de extrema importância, para entender como ele se coloca diante das suas construções. A desatenção, a impulsividade, a falta de controle das emoções, a dificuldade em lidar com laços afetivos, ordem e organização podem levar o jovem a se descontrolar e não conseguir progredir, ou seja, alcançar o controle de suas capacidades. A incapacidade de prever consequências é um dos grandes problemas do portador de TDAH, principalmente na adolescência.

forma de lidar com esses percalços na passagem da adolescência para a vida a adulta é ser bem sucedido em alguma área nessa fase da vida e ter um acompanhamento terapêutico. Seja na escola, na família ou numa atividade esportiva é importante o jovem saber, que apesar do seu transtorno, pode realizar muito bem diversas atividades propostas nesse momento de sua vida. Ainda de acordo com o Manual, deve-se

[...]reforçar a recomendação de se utilizar uma estratégia que enfatize os pontos fortes do adolescente e minimize seus pontos fracos. Propicia-se, dessa forma, o sucesso que leva a um aumento da autoestima e da autoconfiança. Chegar à vida adulta de maneira satisfatória está relacionado a fatores como temperamento, capacidade intelectual, desenvolvimento emocional adequado, intervenções terapêuticas, ambiente familiar favorável e maneira de educar. (Manual Clinico do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Org.: Ana G. Hounie e Walter Camargos Jr. Editora Info Ltda, 2005., p. 501)


TDAH na fase adulta

Muitos estudos indicam que o TDAH é um transtorno que às vezes se dissipa na fase da adolescência. Ou seja, as características de TDAH se atenuam de tal maneira que o indivíduo consegue levar uma vida normal, como qualquer pessoa não-TDAH. No entanto, isso só pode ser possível quando o portador do transtorno é diagnosticado de forma correta e assim ser submetido a um tratamento adequado, seja ele farmacológico e/ou terapêutico, mas que seja rigorosamente acompanhado por profissionais especializados e conscientes.

Um adulto que tem os sintomas do TDAH continua tendo queixas em relação á impulsividade, concentração e principalmente de sua capacidade de atenção. Percebem que essas funções são de extrema importância para a execução de atividades mais elaboradas que a atual fase da vida exige. Alguns adultos relatam que jamais conseguiram ler um livro inteiro, e frequentar uma faculdade acaba sendo um desafio. Por outro lado, alguns adultos com TDAH que conseguem completar o ensino superior e ingressam no mercado de trabalho relatam enfrentar problemas de baixa produtividade, pela má administração do tempo e desorganização. As relações afetivas também são comprometidas pela dificuldade de modulação das emoções.3

O indivíduo portador do TDAH pode criar estratégias compensatórias para amenizar os possíveis danos, como:

o uso constante de agenda para evitar falhas de memória, o adiantamento do relógio para compensar o atraso habitual, e alguns até desenvolvem uma verificação obsessiva, na tentativa de compensar uma iminente desorganização. Nesses casos, o papel do terapeuta consiste em reforçar e até em estimular o aperfeiçoamento desses hábitos compensadores, ao mesmo tempo, livrando o cliente da culpa de fazer uso deles. (Manual Clinico do Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade. Org.: Ana G. Hounie e Walter Camargos Jr. Editora Info Ltda, 2005., p. 538)


TDAH na fase de envelhecimento

Existem poucos estudos que relacionam o idoso ou a fase da velhice com o TDAH. Contudo, podemos fazer um breve paralelo entre as características do envelhecimento, onde são frequentes as perdas das competências cognitivas (memoria, raciocínio, atenção, aprendizagem, etc.) e motoras. A ideia de “fim”, “declínio” e “morte” estão altamente ligadas ao fato de envelhecer. Porém, uma nova concepção adaptada ao idoso, denominada de “envelhecimento ativo”, olha para ele como alguém que ainda deve e pode produzir.2 A ideia do Lifespan (paradigma de desenvolvimento ao longo da vida), parecer ser uma intervenção benéfica ao envelhecimento saudável, no entanto ainda não faz parte da formação de muitos psicólogos brasileiros.

6 comentários:

  1. Olá! Adoreii o blog de vcs! Tenho tdah e tenho 23anos, essas estrategias que vcs colocaram ai, na parte do adulto, como o uso de agenda e adiantar o relogio, me ajuda muito no dia-a-dia! Comigo funciona!!!

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  2. Me sinto extremamente aliviada por ter encontrado essa página e gostaria de pedir certo esclarecimentos a vocês, pois todos com quem tentei conversar sobre o meu problema não me serviram de muita coisa.
    Foi recentemente descoberto que porto o TDAH e não sei se foi tarde demais ou se ainda posso me tratar. Tenho dezessete anos e sou Olindense, conclui o ensino médio ano passado e garanti minha vaga em uma universidade pública no curso que almejava, mas ainda assim sentia (sinto) certa angustia com os empecilhos que essa doença me proporciona, principalmente na hora de ler, assistir filmes ou até mesmo conversar com as pessoas. Por mais que eu tente me trabalhar para focar nas coisas que quero fazer, quero alcançar, ainda não consigo nem 50%. Tenho essa constante inquietação nos membros, essa agonia e ansiedade o tempo todo, que me impede de fazer qualquer outra coisa que não seja escutar música.
    Como irei começar a faculdade e sei que há uma grande diferença dela para a escola, procurei um tratamento mais eficaz e me indicaram o uso da Ritalina. Devo salientar que pretendia fazer todo o tratamento do TDAH sem ter que recorrer à medicações, principalmente depois de ler a bula do remédio e ainda assistir alguns depoimentos sobre ele. Mas como não consigo formar uma opinião decisiva sobre o uso do medicamento ou não, gostaria de perguntar a vocês se isso poderia me ajudar a estudar melhor. Gosto dessa parte hiperativa da minha personalidade e gostaria de saber como esse remédio influenciaria no meu comportamento e relacionamento com as pessoas. Sinto que toda matéria que leio sobre a Ritalina me passa a impressão que a pessoa se torna um zumbi ao usa-lo e, como ando vendo muita gente que não porta o TDAH usando o medicamento, gostaria saber se isso também vem ajudando a mistificar o uso da droga.
    Gostaria muito de receber uma resposta de vocês e obrigada pela atenção! :D

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    1. Nem todo portador de TDAH precisa tomar remédio, depende de cada caso. A Ritalina (metilfenidato) pode ser bastante eficaz quando utilizada de maneira apropriada, aliada ou não à psicoterapia. Algumas pessoas relatam enfrentar problemas com o uso desse medicamento, como constantes dores de cabeça ou o não alcance dos efeitos esperados. Já outras relatam apresentar melhoras consideráveis, como um bom desempenho acadêmico. Dê uma olhada no nosso post sobre o uso da Ritalina no TDAH: (http://quasesemquerertdah.blogspot.com.br/2013/12/uso-da-ritalina-no-tdah.html)

      Com relação às pessoas que não precisam do medicamento e fazem uso dele (para melhorar o desempenho cognitivo em estudos para concurso, por ex.): isso só prejudica as pessoas que realmente precisam.

      Converse com um profissional especializado e familiarizado com o tema. Ele vai analisar o seu caso e indicar o melhor tratamento para você. Nunca é tarde para procurar ajuda, especialmente se você tem dúvidas sobre o assunto ou enfrenta algum tipo de problema relacionado do TDAH.

      Visite o site da ABDA (www.tdah.org.br), lá existe uma aba de Profissionais para Tratamento com a indicação de médicos e psicólogos em Recife.

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  3. Muito bom o texto "TDAH e as fases da vida: adolescência, adulto e velhice"!

    Como um TDAH auto diagnosticado aos 46 anos de idade, gostaria de fazer alguns comentários.
    No natal de 2013 me dei de presente uma linda agenda com a promessa de usá-la. Até que no início desse ano foi bom, mas, alguns problemas profissionais em fevereiro me fizeram perder o entusiasmo e então... a agenda está parada lá num cantinho do meu quarto desde março!
    Mas, não estou triste ou decepcionado. Agora consigo (me) entender. Nós, TDAHs, somos frágeis emocionalmente/psicologicamente e qualquer reviravolta expõe essa fragilidade. Vou me reprogramar!
    Porém, na minha opinião de leigo, o traço característico mais marcante nos portadores do distúrbio é a sua condição financeira/social, quando comparada com a sua capacidade intelectual (isso para aqueles que não tem comorbidades cognitivas). Nós simplesmente não conseguimos nos organizar no aspecto financeiro e nossa vida social, por tabela, também fica comprometida. Não estou falando de quantidade de reais($) e sim de como administramos ele. Pouco ou muito, se não tivermos consciência da nossa condição e se não fizermos um esforço para superar essa limitação, seremos uns eternos fracassados!
    Muitas pessoas que me conhecem não acreditam que tenho TDAH. Dizem que eu sou muito inteligente e não concordam com o meu autodiagnóstico. Ao mesmo tempo me cobram uma melhor posição social, já que eu sou "tão inteligente". Não fico mais encucado com isso. Elas não sabem a diferença entre distúrbios de comportamento e distúrbios de aprendizado, eu sei!
    Sei também que a minha vida tomou um novo impulso, após a descoberta.
    A medicação (concerta 46mg) foi decisiva no início. Foi como se eu passasse a ver a vida com outros olhos: um mundo novo surgiu a minha frente. Ainda faço uso em alguns momentos mas sinto que muito em breve não precisarei mais.
    ...E a vida segue em frente. Uma nova vida, sem culpas, medos e indecisões.

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