Por João Cavalcanti
Não sei responder esta pergunta com certezas,
aliás, o próprio transtorno é, não raramente, confrontado com incertezas. Ele
existe de fato ou foi uma doença inventada? Tem resposta pra todo gosto. O que
realmente importa para mim é que alguma coisa é fora do "padrão" no
meu funcionamento, e para se fazer uma afirmação
destas é necessário ter um "modelo" para comparar e ver o que está em
desacordo com o "correto".
Como se pode
observar, em um parágrafo cabe tantas possibilidades de interpretações que se
chega a desanimar ou animar quem estiver com alguma curiosidade sobre o
assunto. A primeira coisa que devo dizer é que receber um diagnóstico deste não
foi a coisa mais terrível de minha vida, mas foi uma coisa que me fez mergulhar
na minha história para saber até onde isso influenciou ou não minhas escolhas e
suas consequências. Num primeiro instante quis saber o que era aquilo, de que
realmente se tratava o tal transtorno, pois diferente de ter sido diagnosticado
com HAS, uma condição que ninguém nunca contestou (pelo menos não ouvi uma voz
em contrário) e de fácil entendimento com uma simples explicação do
cardiologista, este TDAH era uma novidade e, descobri logo na partida, um
"modismo" para uma parcela dos médicos.
Aqui cabe a minha
primeira reflexão; qualquer doença que seja mental, e o TDAH está nesse balaio,
já é olhado com reserva e se a ela não se apresenta uma causa física geradora
(até hoje não se consegue ligar a nada) entramos no universo dos psiquismos,
matéria controversa não só entre os médicos mas também entre os psicólogos.
Para os leigos, doença mental é coisa de doido - não importa que isso não seja
necessariamente assim - e daí vem uma avalanche de preconceitos e
afastamentos... Também não acho que viver com um doido seja fácil, mas e quando
você não tem opção de não viver sem ele ao lado?
Pois eu tenho que
conviver com o meu doido, goste ou não goste, não tenho escolha; e tenho, mas
passa por renunciar a vida, coisa que já pensei frequentemente. Restou-me por
uma dedução racional, conhecer o meu problema, e fui estudar sobre o TDAH e
saber como tirar partido das minhas limitações (se existirem; é que sou avesso
a acreditar em qualquer coisa que tolha minhas possibilidades). E fiz isso ao
cabo de 3 longos anos. O resultado não foi bom: como clímax desta situação
terminei por ter um surto psicótico e imagino (não tenho certeza desta
afirmação, estava só e não tenho como checar) ter tentado o suicídio... o
socorro que pedi, e sei que pedi, não veio a tempo por que
razões não sei (mas talvez seja aquela que já mencionei, não é fácil viver com
um doido) e quando chegou, não veio como alento e sim aumentando meu
sofrimento. Foi a coisa mais difícil na minha vida até aquele momento (não
tenho ilusões de que outras coisas piores não possam acontecer, mas não
empresto muito valor as desgraças humanas futuras, já é de bom tamanho as do
presente e luto para descartar as do passado) e de certa forma ainda é
atualmente, é que tudo isso acaba de completar 2 anos. Muito tempo para sofrer e pouco para se restabelecer.
Vou arriscar responder aquela pergunta
inicial; sei que existe um transtorno, sei que não é uma novidade na história
médica pessoas com este padrão de comportamento, sei que hoje se fala muito
sobre este assunto (talvez o "modismo"), sei que aumenta
exponencialmente o número de diagnóstico de TDAH, sei que colocam a indústria
farmacêutica por trás do transtorno, sei um bocado de coisa, mas não sei
explicar como é ser um TDAH (último nome para um transtorno que já teve tantos
nomes, incluindo o Disfunção Cerebral Mínima, termo usado pela primeira vez em
1962, um avanço se comparado a Lesão Cerebral Mínima utilizado em 1947... mas
aqui se imaginava uma lesão, então tinha uma assinatura física em alguma
estrutura). Não sei o motivo, desde que me lembro e dos que os outros se
lembram de mim, tive este comportamento. Sei que meu jeito é considerado fora
dos "padrões" que alguém em algum momento estabeleceu como sendo o
normal. Mas também não sei porque existe padrões para seres humanos. Somos tão
diversos. Luto contra o preconceito, exponho minha cara, não dou brecha à
violência de me estigmatizarem, dou nome aos meus sentimentos, reajo porque se
não for deste jeito vão conseguir me inferiorizar. Mas não pensem que isso é
fácil, foram embora muitos sonhos, muitos desejos, foi embora parte do brilho
no olhar. Pessoas se afastaram quando recebeu o nome de transtorno o meu jeito
de ser, minha vida foi comprimida pelos "normais" e é muito difícil e
solitário lutar contra isso. Mas luto. Na verdade o que me salva é ter
aprendido a viver sozinho (coisa que já sabia fazer antes de o diagnóstico vir)
e um humor que por vezes permite eu rir de mim mesmo.
Me diz aí, como é
ser um NORMAL?
https://www.youtube.com/watch?v=uVzHEZIdC5A
ResponderExcluirvisão espirita do tdah!
Gostei muito do seu depoimento joão, todos nos temos limitações, não se sinta anormal por ter TDAH. Você é um vencedor, e não permita que ninguém fale ao contrario. bjs
ResponderExcluirMuito obrigado por compartilhar seu sentimento. Posso dizer, como portadora me sinto da mesma forma, muitas vezes sinto que não tenho mais forças para continuar, mas a verdade é que não podemos deixar que as dificuldades do TDAH vençam, que as inseguranças do passado façam o nosso futuro, porque se não perdemos de perceber o quão forte e especial somos, e de como a vida é linda e está aqui para nós.
ResponderExcluirAbraço, Rafaela Ribeiro.